Sexta-feira, 28 de Novembro de 2014
publicado por JN em 28/11/14

IMG_5601.JPGPrimeiro são os termos. Piscas e pechinchinhos. Tarelos e tafulhos. Gamas e donetes, sueras e alvarozes. Cambetas, banaços, batacús. Derriços e enriços. Belicas e biscoitas. Valhacas e maraus. Pitafes e tricofáites. Custódios, alaricados, laparosos. Naiões, basões e tatões. Às vezes trata-se apenas de um português mais antigo, não tão distinto assim daqueles que encontramos em Trás-Os-Montes ou nas Beiras. Mas também há americanismos, eufemismos, regionalismos em geral – até localismos vindos de uma memória popular mais recente do que imaginamos.

Depois são as expressões. As sinestesias. As metonímias. As metáforas. As hipálages. “Tu és um disparate!” como elogio: és o maior. “Faz-te discretinho!” como ralhete: está sossegado. “Eu digo-lhe vergonhas” como gabarolice: digo-lhe tudo quanto me apetece e ela ainda não me esbofeteou. “Salta p’á carrinha!” como malandrice: anda cá, garota, que eu faço-te desgraças. “Já estás a derramar” como alerta: não bebas mais que só dizes asneiras, vê-se logo que estás “três vezes nove vinte e sete”.

Ou bêbedo.

Uma pessoa vai na urbana e não tarda está a meter conversa com a senhora que torce o nariz a um miúdo ao fundo.

– Credo, aquele rapaz é um cegão...

– O que é "cegão"?

– Está sempre a tecer!

– O que é "tecer"?

– É inticante.

– Ah.

“Urbana” é a carreira urbana: o autocarro que vai das freguesias à cidade. Fora as horas de ponta, leva sobretudo velhotas: algumas aberrocidinhas, outras mais tenteadinhas e outras já encarreiradinhas. Em havendo bagalhoço, o sol brilha.

Quem poderia resistir ao falar desta terra?

Diário de Notícias, Novembro de 2014

comentar
| partilhar
6 comentários:
De Mário Pereira a 7 de Dezembro de 2014 às 21:05
Para que é o acento no u em batacus?
De JN a 8 de Dezembro de 2014 às 09:25
:) Uma pequena redundância.

Comentar post

Joel Neto


Joel Neto nasceu em Angra do Heroísmo, em 1974, e vive entre a freguesia rural da Terra Chã, na ilha Terceira, e a cidade de Lisboa. Publicou, entre outros, “O Terceiro Servo” (romance, 2000), “O Citroën Que Escrevia Novelas Mexicanas” (contos, 2002), “Banda Sonora Para Um Regresso a Casa” (crónicas, 2011) e “Os Sítios Sem Resposta” (romance, 2012). Está traduzido, editado e/ou representado em antologias em países como Inglaterra, Polónia, Brasil, Espanha e Itália. Jornalista de origem, trabalhou na imprensa, na televisão e na rádio, como repórter, editor, autor de conteúdos e apresentador. Hoje, dedica-se sobretudo à crónica, ao diário e à crítica, que desenvolve a par da escrita de ficção. (saber mais)
Moradas
no facebook
pesquisar neste blog
 
livros de ficção

Os Sítios Sem Resposta
ROMANCE
Porto Editora
2012
Saber mais
Comprar aqui


"O Citroën Que Escrevia
Novelas Mexicanas"

CONTOS
Editorial Presença
2002
Saber mais
Comprar aqui


"O Terceiro Servo"
ROMANCE
Editorial Presença
2002
Saber mais
Comprar aqui
outros livros

Bíblia do Golfe
DIVULGAÇÃO
Prime Books
2011
Saber mais
Comprar aqui


"Banda Sonora Para
Um Regresso a Casa

CRÓNICAS
Porto Editora
2011
Saber mais
Comprar aqui


"Crónica de Ouro
do Futebol Português"

OBRA COLECTIVA
Círculo de Leitores
2008
Saber mais
Comprar aqui


"Todos Nascemos Benfiquistas
(Mas Depois Alguns Crescem)"

CRÓNICAS
Esfera dos Livros
2007
Saber mais
Comprar aqui


"José Mourinho, O Vencedor"
BIOGRAFIA
Publicações Dom Quixote
2004
Saber mais
Comprar aqui


"Al-Jazeera, Meu Amor"
CRÓNICAS
Editorial Prefácio
2003
Saber mais
Comprar aqui
subscrever feeds
pesquisar neste blog
 
tags
arquivos
links