Às vezes temos um pico de trabalho e suspendemos as caminhadas matinais. Outras é o Melville que anda impossível, a arfar por passeios longos, e temos de mudar de trajecto e de hora, porque a princesa não tolera que outros cães pisem o mesmo alcatrão que ela.
O regresso é sempre encantador: porque a paisagem tornou a mudar, porque o mar nos espera na ida e a montanha na vinda, e também porque pelo meio há o Guarita.
O supermercados Guarita, agora uma pequena cadeia, são o epítome de um tempo. Por um lado, hão-de ter prejudicado algum comércio tradicional. Por outro, não deixam de ser eles próprios comércio tradicional. Abrem e fecham cedo, têm os mesmos empregados durante anos e conhecem os clientes pelos nomes, pelos hábitos e pelas reputações.
Vamos desde o primeiro dia ao Guarita da Terra do Pão. Abastecemo-nos de mercearias, cigarros e cafés. As empregadas assinalam quando chegamos dez minutos mais tarde ou mais cedo. Não havendo outro tema, perguntam pelos livros ou pelo cão.
Aqui há dias, encomendámos cuscuz. Certos produtos continuam algo estrangeiros aqui, pelo que às vezes temos de ir ao capitalismo comprar parmesão, pesto, óleo de amendoim. Entretanto, pedimos ao sr. Marcelino para ver se conseguia arranjar cuscuz.
Tratou de tudo em 48 horas: mandou investigar as marcas, fez uma ronda pelos outros supermercados, conferiu connosco do que se tratava. Dois dias depois, não havia uma empregada que não tivesse para nós o recado de que o cuscuz chegara e, afinal, não era massa.
Trouxemos um pacote apenas. Os restantes ainda lá estão. Trá-los-emos um a um, até que fiquemos cheios de tagines e tabboulehs por uns meses.
Nem sempre se encontrava esta alegria no velho comércio. Não vivemos um tempo tão desesperado assim.
Diário de Notícias, Abril 2015
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